sábado, 22 de janeiro de 2011

Prenda de Natal - Parte I

-Olá Tia! Tudo bem?  
Era a noite da véspera de Natal. Como era habitual, havia sempre o jantar de família e a troca de prendas à meia-noite. Éramos uma família simples mas muito unida. O David já se tinha ido embora há três dias, agora só falávamos por mensagens e às vezes ele ligava-me para “ouvir a minha voz”. Certas vezes nem falávamos, ficávamos só ao telemóvel a ouvir a respiração um do outro. Parece estranho e estúpido, mas não há maneira para explicar. Sentia-me mais próxima dele todos os dias e as saudades aumentavam a cada dia que passava. Dias antes de ele ir-se embora, dei-lhe uma prenda. Pedi para não abrir, só no Natal, tal e qual como a minha prenda. Essa estava na minha mala, era uma caixa pequena, mas a vontade de abri-la era muita. Nos dias antes da partida, todos os momentos com David eram precisos. Almoços, conversas ao telemóvel, passeios. Sempre que almoçávamos juntos fazíamos em sítios de confiança ou então sítios completamente vazios. Os passeios por sua vez eram na praia (que no inverno está completamente deserta) ou em parques. Nunca nos exponhamos em centros comerciais ou até em sítios com muitas pessoas. Não é que agíssemos como namorados, nada disso. Apenas dávamos passeios e falávamos, há muitas pessoas que fazem isso e que não têm relacionamento algum mas não queria que alguma revista nos apanhasse e fizesse disso notícia da semana. A minha vida é a minha vida, mais ninguém tem haver com ela. Sou uma pessoa, não uma notícia de jornal.
-Olá filha! Aí, estás tão diferente! Olha para isto! Uma mulher! Ó Fausta! Fausta! Anda cá ver a mulher que nós temos aqui! – dizia a minha tia Carolina. Da parte do meu pai tinha duas tias, a Tia Fausta e a Tia Carolina. Sempre me trataram como sua filha. A tia Fausta era casada com o tio Carlos. Tiveram dois filhos, infelizmente um morreu aos dois anos de pneumonia. Embora já se tivessem passado vinte anos a minha tia nunca esqueceu a morte do filho mas amava a sua filha, Joana, de dezoito anos. A minha Tia Carolina era casada com o meu Tio Miguel e juntos tinham dois filhos, Miguel João e João Miguel, de dezasseis anos. Eram gémeos, se já era difícil diferencia-los, imaginem agora com o nome quase igual! Da parte da minha mãe tinha o Tio Francisco que era casada com a Tia Francisca, o casal “Chico e Chica” como eram conhecidos na nossa família. Tinham um filho, o Tomás, de vinte e cinco anos. Era o mais velho de nós, os primos(tirando o meu irmão). Depois tínhamos o último, o Tio Alexandre que era casado com a tia Maria, juntos tinham um filho, Frederico. Uma família grande de facto e eu adorava o Natal por isso mesmo. Eram raros os dias onde juntávamos a família toda. Fazendo as contas, 5 casais e 8 primos. Complicado sentar aquela gente toda mas a sala era grande e cabiam lá todos. A minha tia Fausta veio logo a seguir.
-Aí a minha sobrinha linda! Olha lá para isto!
-Tia! Como está? Há tanto tempo!
-Aí filha, já não estou tão rija como antes. Dói-me as pernas e as costas, devo ter qualquer coisa.
-Tia, não seja assim. Você está óptima!
Seguiu-se os cumprimentos ao resto da família. Era muito próxima de Joana, quando me viu abraçou-me como se não houvesse amanhã. Em miúdas éramos quase como irmãs, vivíamos perto uma da outra, depois a minha tia mudou-se para a Margem Sul. Afastamo-nos um pouco mas a intimidade continuava a mesma. Tomás estava vestido de fato e gravata, já nem o conhecia. Estava tão diferente, parece que depois de velho tinha crescido. Ele sempre foi muito ambicioso e foi isso que levou-o a cargos altos. Era um dos assessores de Paulo Portas, passava mais de metade do ano fora de Portugal por viagens em todo o mundo a fazer negócios. Para ele era tudo uma questão de negócios e um bom negócio implicava dinheiro. De facto, a única vez que vi o Tomás feliz foi quando ele teve um caso com Vera, a partir daí foi sempre uma pessoa fria e calculista. Acho que o facto de ela ser muito parecida com ele fez com que ele se apaixona-se e nunca mais voltou a ser o mesmo. Mesmo assim, Tomás era uma pessoa fascinante, com uma QI fora do vulgar. Cultura Geral era com ele. Os gémeos jogavam consola ao lado de Frederico, o “génio dos computadores” como lhe chamava. Era Engenheiro Informático mas era mais um hacker do que Engenheiro Informático. O meu irmão falava ao telemóvel perto da janela da sala. A minha cabeça começou logo a magicar. “O meu irmão, ao telemóvel, no dia de Natal?! Não pode ser! Queres ver que… Aí, vou ter que saber!”. Coloquei a minha prenda na árvore de Natal e fui ajudar as mulheres na cozinha enquanto os homens falavam de futebol sentados à mesa na sala, a comer camarões e a beberem cerveja. Assunto principal: Benfica.
-Mãe, queres ajuda em alguma coisa?
-Olha filha, não há nada para fazeres. Já somos tantas que despachamos isto tudo num instante.
-Realmente e esta cozinha é pequena para tanta gente. – Dizia a tia Maria.
-É pequena hoje e grande amanhã, Maria. Já tenho saudades de quando eles eram pequenos e passavam os dias a correr pela casa adentro.
-Ó mãe, mas não te preocupes, isso resolve-se. Amanhã estou cá para comer também!
-Filha, sabes que não é bem isso que quero dizer. Tu saíste de casa, o Tiago mais um ano e põe-se andar também e depois fico só eu e o teu pai. Tenho que decidir o que fazer com aqueles dois quartos.
-Olha Zita – A minha mãe chamava-se Maria José mas toda a gente tratava-lhe por Zita – vende esta e compra uma casinha pequena. – dizia a minha tia Carolina.
-Deixem-se lá de coisas que eu quero é saber das nossas meninas. – Agora era a vez da minha tia Chica mostrar a sua faceta coscuvilheira – Como vai de namoros?
-Tia, já sabes tudo sobre mim. Eu continuo encantada com o meu namorado Pedro. – Joana namorava com Pedro desde dos quinze anos de idade e por mais incrível que pareça, eram feitos um para o outro. Completavam-se de uma forma fascinante e amavam-se de uma ainda mais impressionante.
-Qualquer dia casam-se. – dizia a minha mãe.
-Cala-te mulher! Ainda são muito novos! – “Namoros antes dos trinta, jamais!” dizia sempre a minha Tia Fausta. Lembro-me de ela dizer isto desde muito novinha.
-Então e tu, Maria? – Já sabia que tinha que vir para o meu lado. Nunca escapava nada à minha tia Chica.
-Eu? Olha tia, eu terminei a minha relação com o Diogo.
-Aí querida, o que aconteceu. Conta a tia! Senta-te aqui. – Sentei-me ao lado da minha tia Carolina. Joana também se sentou, a cara dela foi de choque, não estava à espera de tal coisa. A verdade é que só os mais próximos sabiam do fim da relação. – Então, ele andava-me a trair com uma fininha qualquer. Nem aí, nem uí. Terminei tudo com ele.
-E como estás Maria? Foi uma relação de longa data. – Perguntava a minha tia Maria. – Destino cruel.
-Sabes tia, agradeço a Deus por nos ter separado. O meu pai sempre teve razão, ele não era homem para mim e a verdade é que, se ele me amasse tanto como dizia, não tinha feito nada daquilo. Estou melhor do que nunca.
-Aí que o rouxinol anda perto. – disse a tia fausta.
-Quem é o rapaz?
-Que rapaz?! – Interrogava a minha mãe já preocupada. – Maria Duarte! Tu vê lá no que te metes!
-Rapaz? Que rapaz? Não anda rapaz nenhum! Agora eu quero estar em paz, sossegada e estou bem assim. Homens não me fazem falta nenhuma.
-Querida, o homem, faz sempre falta. Embora alguns comportamentos são eles é que nos fazem companhia.
-Bem tia, tens razão mas… estou à espera do homem ideal. Do homem dos meus sonhos, o que me trás flores, me leva a sair, que se preocupa comigo dia e noite e que me surpreende todos os dias. – Acabei por fazer um sorriso parvo, lembrei-me de David e como esta caracterização lhe era perfeita.
-Aí que sorrisinho é esse?
-Por favor, não contem isto aos homens da família. O meu pai não sabe e o meu irmão nem sonha! Nem pode saber! – Acenaram afirmativamente com a cabeça - Já falei que trabalho no Benfica? – tentei desviar o assunto.
-A tua mãe já nos contou. Como está a correr?
-Lindamente. É muito bom mesmo! Eu adoro!
-Ó prima, e o jeitoso aos caracóis, ele vai sair do Benfica agora? – “Aí prima, tão próxima que tiveste agora”, pensei. Engoli a seco, não sabia nada sobre isso. Primeiro porque não queria saber, segundo porque não falava disso com o David. Queria aproveitar todos os momentos com ele, junto dele. Não queria falar de coisas que poderiam ferir os meus sentimentos.
-Não sei Joana, eu sou Guia de visitas ao Estádio da Luz, não gestora da SAD Benfiquista.
-Hás-de lá chegar, filha. Bem, vamos levar as coisas para lá, está na hora de jantarmos, já está tudo pronto.
Já era quase oito horas quando a comida foi servida a mesa. Como éramos muitos estavam duas mesas, uma para os casais e outra para os primos. Aqueles jantares eram sempre divertidíssimos, sentia uma saudade enorme de ser criança outra vez, das brincadeiras que tínhamos quando íamos todos de férias ou para o norte ou para o Algarve. Era maravilhoso. Tiago, rezingão como sempre estava ao meu lado só a chatear-me.
-Então Maninha, e o David?
-Hã?
-Sim, o teu amigo.
-Eu sabia Maria! Estavas a esconder alguma coisa na cozinha, quem é o David? – perguntava Joana.
-É um amigo, um grande amigo que me ajudou a superar o fim da relação com o Diogo.
-Um amigo? Tu a mim não me enganas. Olha para ti! Estás feliz! Uma pessoa quando termina uma relação não fica feliz.
-E prima, acabaste com o Diogo? Ele arranjava uns jogos tão curtidos para a PS3. – dizia João Miguel.
-Curtidos? Então e a PS3 que ele nos deu o ano passado? Lembra-te que só tens os jogos porque ele nos deu a PS3. Fogo, acabaste logo com o ricaço. Não podias esperar mais uns anos? – dizia Miguel João. Aqueles dois, uns viciados do pior.
-Putos, calem-se. Nem acredito que acabaste com ele. Pareciam gostar muito um do outro, como se fosse perfeitos um para o outro, tal e qual como as minhas colunas são perfeitas para o meu computador.
-E meu, já começas com as tretas dos pc’s? E depois dizes que não tens namoradas, Fred. – Gozava Tiago. O meu irmão podia ser o mais velho mas era o piorzinho.
-Tiago! Deixa-te de coisas. Pois é Fred, às vezes nem tudo o que parece realmente o é. Fui muito bem enganada mas já não caio uma segunda vez na mesma.
-Nem acredito que ele foi capaz de te fazer aquilo.
-Aquilo o quê? – Ainda não tinha contado nada a Tiago. Dei um pontapé a Joana debaixo da mesa. Ela soltou um pequeno grito de dor. – Mau! O que é que aquele palhaço te fez?!
-Tiago, ele andava-me a trair. Agora caladinho! Não estragues a noite de natal!  
-Esse betinho da merda. Se o vir na rua vai-me ouvir, apanha um murro naquele foci…
-Tiago! Já chega!
-Ele traiu-te Maria? – Perguntava João Miguel.
-Fogo, grande cabrão. Agora já nem uma PS5 aceito vindo desse! – Toda a gente se riu do que Miguel João disse. O puto era engraçado, devia ter milhares de miúdas atrás dele, tal e qual como o seu irmão.
-Já chega! Vamos mudar de conversa. Então e tu Tomás, como tem corrido a vida? Namoradas?
-Tem corrido bem, na última semana estive em Tóquio e vou passar a passagem de ano em Nova Iorque, Times Square para ser exacto. Namoradas... Não tenho tempo para isso.
-Estou a ver, muitos negócios então.
-Sim, felizmente tem acontecido tudo muito bem. – disse enquanto pousava os cotovelos na mesa e juntava as mãos. – e vocês, como têm andado?

4 comentários:

  1. GOsteii muiitO...

    FiicO a espera de maiis.. =D

    BjnhOs

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  2. Aii agora quero a continuação!
    Esta fantástico.
    Quero saber qual é a prenda do David.
    Beijinhos Inês :)

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  3. Muito bom, mesmo muito bom. Faz mesmo lembrar uma cena de familia... fartei-me de rir.
    Muito bom
    Continua
    Beijinhos

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  4. Quero mais e rapidinho ou entao vais-me visistar ao hospital com ataque de curisidade (;

    Beijinho*

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