segunda-feira, 13 de junho de 2011

Regresso com final feliz?



-Matilde! Matilde!!! Tu não vais acreditar! Vou voltar para Portugal! Eu vou voltar!
Afastei o telemóvel um pouco do ouvido. Matilde estava a gritar de euforia. “Não acredito! Tu vais voltar! Ó meu Deus! Rúben!!! Rúben! A Maria vai voltar!!”
Tinham passado seis anos, agora os meus vinte e oito anos já pesavam e estava a uma semana dos vinte e nove. Quando sai de Londres, regressei a Portugal durante uma semana e quando pude mudei-me para Cleveland. A cidade é gelada, seja de inverno ou de verão. Não estava habituada a este clima. Embora fria, Cleveland é um sitio maravilhoso, as pessoas são civilizadas e simpáticas. Completei o meu mestrado em dois anos e já trabalhava  há quatro no clube Cleveland Cavaliers. Tinha começado a estagiar lá mas rapidamente subi para postos melhores. Agora era Gestora do desporto nos Cavaliers.
         A minha vida tinha sofrido diversas alterações. Só ia a Portugal no Natal e no Verão. Embora a distância não perdi contacto com ninguém, ou quase ninguém. Diogo começou aproximar-se de mim quando estive em Portugal, percebi que a sua obcessão tinha ultrapassado todos os limites e que tinha sido ele a divulgar o meu namoro com… David.
         Não, nunca o esqueci. Permaneceu sempre na minha memória mas tive que seguir em frente na vida. Tornei-me um pouco como Vera, fria e calculista. Envolvi-me com vários homens, muitos do campeonato norte americano de basquete mas nenhum deles me fazia feliz como David fazia. Depois de estar com David, a relação mais longa que tinha tido foi de um mês. Continuava a ama-lo. Pensava nele todos os dias, sentia a sua falta todos os dias e tentava procurar novidades sobre ele, até o dia que entendi que ele também tinha seguido em frente com a sua vida. Mas isso não interessa para nada, a boa notícia é que iria voltar a Portugal e tinha conseguido o melhor emprego do mundo. Administradora Executiva do Sport Lisboa e Benfica. Não ia receber nem metade do que ganho em Cleveland mas a vontade de voltar a Portugal e de trabalhar no clube do meu coração fazia valer a pena.
-Peço imensa desculpa, mas tem que acordar. Daqui a cinco minutos vamos aterrar.
-Obrigada. – Estava ansiosa para ver a minha família, amigos... O meu irmão estava de casamento marcado e julgo que a Matilde estivesse muito próxima de ter data marcada também. Rúben já lhe tinha pedido em casamento. Estavam juntos há tanto tempo que só faltava o pedido.
-Maria!! Maninha feia!
-Meu querido Tiago! Como estás? Onde está o pai?
-Ficou em casa, está a fazer uma festa surpresa para ti.
-Então Tiago! Assim já não é surpresa!
-Se mentisse, irias saber que estava a mentir. Depois ias atordoar-me o caminho até casa… Assim ao menos vamos falando sobre coisas mais sérias. – Agarrou na minha mala e encaminhamo-nos para o seu carro. Em Cleveland o meu carro era um humilde Bentley Continental GT Speed. Infelizmente, tive que o vender. Estava a definir uma boa prenda de casamento para o meu irmão, talvez um Audi Q5. Agora o dinheiro não fazia falta e depois do que lhe tinham feito ao carro, ele merecia algo assim e o seu Peugeot 208 estava a dar as últimas.
-Calma aí, conversa séria? Maninho, acabei de vir de Cleveland, daquela cidade gelada e do meu querido apartamento T2. O que eu preciso agora é de desfrutar toda a beleza de Portugal. Necessito de praia!
-Pois, mas antes de desfrutares toda a beleza de Portugal, vamos para casa.
-Claro. Estou mortinha de saudades da mãe, do pai, da Matilde…

**

Já tinham passado duas semanas desde que tinha chegado a Portugal. As férias estavam acabar, só tinha mais uma semana e depois ia começar a trabalhar. Estava nervosa, ia ser uma nova experiência e tinha que ter muito cuidado com as decisões que iria tomar. Qualquer uma precipitada podia influenciar o Benfica não só financeiramente como desportivamente.
         Andava por Lisboa à procura de um apartamento perto do Estádio. Tinha ficado os últimos dias na casa dos meus pais, não tinha tido ainda muito tempo para procurar casas. Matilde disponibilizou-se para procurar apartamentos comigo. Começamos pelos belos apartamentos em Telheiras. Fiquei apaixonada logo pela primeira casa. Grandes janelas, uma área extensa e a casa muito modernizada. Matilde concordou que a casa era magnífica. O T2 no centro da cidade e perto do Estádio era caro mas valia a pena. Retrocedi na minha intenção de compra quando olhei para a paisagem da minha varanda. Mesmo em frente, conseguia-se ver o prédio onde tinha sido muito feliz uma vez.
-Estava a pensar, perto do estádio estavam a construir uns prédios… Podemos visita-los?
-Claro, mas essa zona é caótica quando há jogos de futebol. – Disse-me o senhor da imobiliária.
-Sim, mas eu não me preocupo com isso.
Matilde percebeu que algo me tinha deixado incomodada.
-Que se passa? Não estavas a gostar da casa?
-Vê-se o antigo prédio do David. Não quero viver aqui. – Estava segura disso, não queria viver junto de recordações. Matilde acenou com a cabeça. Fomos ver outro prédio, em frente ao estádio. A vista da varanda da sala era maravilhosa, conseguia-se ver todo o estádio e as suas imediações. Nem reparei muito na casa em si, mais na sua vista esplendorosa.
-É um T2 grande, muito amplo. Os dois quartos têm casa de banho e roupeiro. Já vem equipado e com equipamentos da LG. Tem óptimos acessos para…
-Ok. É meu.
-Diga? – Acho que o senhor ficou embasbacado com o que disse. Ainda nem tinha apresentado a casa, só a sala e eu já lhe tinha respondido afirmativamente.
-Eu compro, quanto é?
-É 210 mil euros mas se você quiser podemos negociar com o proprietário.
-Não necessito disso, obrigada. – o meu telemóvel tocava, como tinha vários toques para várias pessoas sabia que aquele era do trabalho. – Com lincença. Sim?
-Boa tarde, peço imensa desculpa estar a incomoda-la neste momento visto que só vem trabalhar daqui a uns dias mas o Sr. Presidente necessita da sua ajuda e pedia que viesse trabalhar mais cedo.
-Mais cedo? Como assim mais cedo?
-Agora. Era sobre a contratação de um jogador. Só falta a sua assinatura para a contratação estar concluída, como Administradora Executiva.
Sinceramente não me apetecia nada ir à SAD. Sei como funcionava, ia lá para assinar o papel e depois tinha que ser apresentada a todos presidentes, vice-presidentes, directores, funcionários… Ao mesmo tempo, não podia recusar prestar um serviço ao clube. Suspirei fundo para perceberem que não estava satisfeita com a decisão.
-Muito bem, eu vou. Mais quinze minutos e estarei aí.
-Obrigada.
-Não vais acreditar? Agora tenho que ir à SAD assinar uns papéis. Peço imensa desculpa mas trataremos das coisas amanhã?
-Claro, as horas que lhe der jeito.
-Pode ser às nove então?
-Claro, como a senhor quiser.
-Obrigada. – despedi-me do senhor. Matilde andava pela casa encantada com os seus recantos. – Matilde, despacha-te!
-Posso vir morar contigo?

*
-Tens a certeza que não queres vir comigo?
-Querida Maria, dispenso ouvir as lamechices do teu novo patrão e conhecer todos os seus ignorantes e ignóbeis sócios.
-Tem calma, eu resolvo a situação do Rúben quando começar a trabalhar. Quem sabe, pudera ser já amanhã.
-A animação da tua voz deixa qualquer pessoa felicíssima e contente mas confio em ti. Boa sorte para o trabalho.
-Obrigada Matilde, até logo.
Rúben tinha sido uma das preocupações de Matilde. Rúben tinha uma boa proposta não só para ele mas também para o clube mas Rúben adora o Benfica, logo decidiu ficar. Dirigentes e pessoas com poder do Benfica viraram-se contra ele e querem-no embora do Benfica. Assim que pudesse, era o primeiro assunto que iria resolver.
-Boa tarde. – disse à recepcionista – sou a Maria…
-Duarte. Um prazer conhece-la pessoalmente. Sou a Joana Mauricio, recepcionista da SAD. O presidente está à sua espera.
-É claro. Se me puder acompanhar até à sala.
-Claro.
Os escritórios eram enormes, estava desejosa de ver o meu. Entramos no elevador e subimos ao terceiro andar e percorremos mais uns corredores até entrarmos numa sala de reuniões. Lá encontrei vários homens que me olharam com um sorriso e de alto a baixo. Ressabiados.
-Boa tarde meus senhores, eu sou a Maria Duarte. Pedia que alguém me entregasse um relatório para me pôr a par da situação.
Joana entregou-me logo um mas quando o ia para abrir.
-Antes de mais senhora Duarte.
-Chame-me Maria.
-Maria… Eu sou o presidente, Luís Filipe Vieira. Este é o vice-presidente da secção de futebol, Augusto Silva e à sua esquerda tem o nosso director desportivo Henrique Fonseca. – Lembrei-me de quando o nosso director desportivo ainda era o Rui Costa. Tanto mudou este clube. – Estamos aqui hoje para finalmente concluir a transferência de um óptimo jogador. Este aqui é o director desportivo do Real Madrid e este o empresário do jogador em questão, Jorge Mendes, que deve já conhecer.
-De facto, não. Mas é prazer conhece-los a todos meus senhores. – Voltei a sentar-me para ler o relatório. O Sr. Augusto veio interromper-me.
-Sabe, eu sou contra este negócio. Vamos pagar nove milhões e meio de euros por um jogador que não é novo, não tem margem de progressão. É claro que ele tem muita garra, mas é defesa central e nove milhões mais dois jogadores dos nossos parece-me um pouco exagerado, não acha Sra. Maria?
-Nove milhões? Dois jogadores? Por um defesa central? Desculpe mas este negócio parece-me surreal. Como vão contratar este jogador?
-Sra. Maria, passo-lhe a explicar. Ultimamente o Benfica nem tem estado muito mal financeiramente. - Claro que não estava mal… Apenas alguns anos sem serem campeões, com contas esquisitas, pagamentos de juros elevadíssimos e todas as contas com números muito redondos, se é que me entendem. – mas os adeptos têm se manifestado e não podemos deixar que as coisas caiam mal. Por isso, trazemos um jogador que todos gostam e pronto, caso resolvido.
-Desculpe mas isso só irá resultar com uma quantidade de Benfiquistas. A outra nem quer saber disso, quer o Benfica campeão. A não ser que claro, este jogador seja o Eusébio ou o Sr. Mário Coluna. – Ouvi algumas das pessoas presentes a rirem-se. – Vamos lá a ver, quem é este bem dito jogador, salvador do Benfica pela sua garra e mística gloria?
-Maria?
O relatório caiu no chão, um arrepio percorreu o meu corpo e senti a vibração da sua voz junto do meu ouvido. Era ele, eu sabia que era ele. Não consegui virar-me para trás, permaneci no meu sitio, sentada.
-Impressionante, não me digam que se conhecem! – dizia o presidente surpreendido. – David, rapaz, como estás? – Finalmente levantei-me e olhei para ele acompanho por ela, a sua nova namorada já de longa data.
-Encontrei este Sr. no café lá em baixo. Um prazer em tê-lo aqui connosco. – dei-lhe um aperto de mão e de seguida à sua namorada.
-Sim, foi isso. Estou óptimo senhor presidente. Não cheguei atrasado pois não?
-Nada disso. Que coincidência, há coisas… Bem, sentem-se e vamos assinar finalmente os papéis. Só falta a assinatura da Sra. Maria e a sua.
Mantive-me a olhar para ele, continuava igual. Cabelo comprido aos caracóis, o seu nariz grande, as pequenas marcas. Tinha umas falhas no cabelo maiores, sempre disse que o ia acontecer cedo. Os seus olhos estavam fixos nos meus, nenhum de nós sabia como agir, o que fazer, o que dizer.
-Sra. Maria, quando puder ler e assinar…
-Claro. Eu gosto das coisas rápidas, o contrato é tal e qual como me transmitiram certo?
-Sim, sim.
-Então, mostre-me onde é os sítios para assinar. – Lá a Joana me mostrou os lugares e depressa assinei. – Meus senhores, peço imensa desculpa mas terei que sair. Com licença e até dia 22.
Abandonei a sala a mil, com a pulsação descompensada, respiração apressada e num nervosismo tal que ia a tremer. Quando cheguei ao carro, não conseguia encaixar a chave. As lágrimas queriam rebentar dos olhos mas eu não deixava, aguentava a pressão durante mais um pouco. Finalmente consegui ligar o carro e desapareci dali, sem rumo, apenas à espera que me dessem um lugar para estar, um sitio para descansar, para o cérebro repousar.

Quatro horas depois, Praia do Pescador, Costa da Caparica.

-Maria! Finalmente atendes, estava tão preocupada contigo. Já soube o que se passou, onde estás?
-Matilde, lembraste quando o Chico morreu? – O Chico era um amigo do meu irmão, também nosso amigo. Quando eu tinha 16 anos, o Chico faleceu atropelado por um carro. – Ficamos todos devastados. O Tiago levou-nos à praia do pescador, para ouvir as ondas do mar mas no final…
-Ficamos no carro a chorar que nem crianças. Recordamos os bons momentos que vivemos com o Chico e sentimos, no final, uma felicidade imensa.
-Eu não sinto isso, eu estou nesta porra de carro à três horas a chorar e não sinto felicidade nenhuma! Apenas tristeza, o coração apertadinho, vontade de desaparecer, ciúmes, inveja. Porquê? Tudo já passou, eu tinha metido isso na cabeça! Ele seguiu com a sua vida e eu com a minha! Porque raio estou assim?! Diz-me! Diz-me!
-Porque ao contrário do Chico, o David está bem vivo e ainda mais vivo e rico está o teu amor por ele.
-Eu lembro-me de tudo, tudo. Os bons momentos, os maus momentos. Os nossos beijos, as vezes em que ele dizia que amava-me, aqueles momentos só nossos, únicos. Parecem cicatrizes que nunca vão desaparecer! É como se eu fosse feita de cicatrizes, que por mais que queira esquecer, elas estão marcadas no meu corpo!
-Maria, tem calma. Vou-te aí buscar.
-Não necessito disso. Já estou mais calma. Amanhã é um novo dia.
-Tens a certeza?
-Absoluta. Vou agora ligar o carro, quando chegar a casa mando-te uma mensagem.
-Mas não te esqueças! Beijo grande!
Liguei o carro e parti para casa. Tentei dormir mas o pensamento era sempre o mesmo, David, David, David.


6 comentários:

  1. esta lindo!!! continua!!! Publica rapido!!!

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  2. Hum quero mais !!
    Esta muito bom este capitulo .. :)
    BjnhO

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  3. Adorei o novo rumo que deste à história! Adorei messssssssssssssssssmo!
    Espero ansiosamente pelo próximo capítulo, com um pequeno pedido, que não demore tanto como este :p
    Beijinhos e parabéns! :)

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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